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Violência doméstica: uso de perguntas ofensivas a dignidade da mulher é alvo de enunciado

A recomendação aprovada na última edição do Fonavid, realizada em dezembro, em Teresina/PI, reforça a aplicação de leis nacionais e internacionais de respeito à intimidade, à honra e à imagem da pessoa ofendida, entre elas, a Lei 14.245/2021. Outra orientação do Fórum é que, para proteger as vítimas de violência doméstica, sejam aplicados os fundamentos da modalidade do depoimento especial.

Desde 2009, o Fonavid atua para aperfeiçoar a aplicação da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006). O espaço, apoiado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), reforça e atualiza o entendimento dos juízes e juízas nessa temática, o Fórum promove debates e compartilhamentos de ações nessa área e finaliza os encontros anuais com apresentação de uma Carta contendo recomendações voltadas à Justiça.

Leia a Carta de Teresina https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/01/carta-xiii-fonavid-docx-6.pdf

É o caso do Enunciado 47 que, atualizado, diz respeito à preservação da dignidade da vítima, orientando os magistrados e as magistradas a, durante o júri ou sessão, se responsabilizarem por evitar a linguagem violenta ou perguntas invasivas, que reforcem o preconceito de gênero.

“Em muitos casos, perguntas são lançadas às mulheres acerca de sua vida afetivo-sexual ou mesmo sobre seu comportamento social, como, por exemplo, quantos parceiros a mulher teve, se ela bebe, se ela costuma sair para a balada, sempre no intuito de desqualificá-la e responsabiliza-la pela violência sofrida”, afirmou a juíza Ana Cristina de Freitas Mota, do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE).

Presidente empossada no Fonavid na reunião de 2021, a magistrada chamou atenção para a covardia desse recurso “que coloca a mulher em uma situação de subalternidade” e reforçou que esse tipo de recurso precisa ser interrompido.

“Devemos ter muita atenção para não deixar que isso seja naturalizado. Diante dessas atitudes, juízas ou juízes devem chamar a atenção daquele que se coloca dessa forma na audiência ou no julgamento, indeferir essas perguntas e caçar a palavra daquele que insiste em utilizar desse recurso.”

A conselheira do CNJ Tânia Regina Silva Reckziegel, que coordena a implementação da Política Judiciária Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, afirmou que o compartilhamento de experiências no Fonavid permite o aperfeiçoamento das ações e reforça o combate à violência contra a mulher e de outras vítimas da violência familiar.

“Os enunciados aprovados, para além de bem salvaguardarem as mulheres vítimas de violência, caminham ao resguardo da tutela jurídica e social pretendida e à garantia dos direitos fundamentais de todo núcleo familiar atingido pelas consequências da violência contra a mulher.”

Supervisora da Política e ex-conselheira do CNJ, Maria Cristiana Simões Amorim Ziouva destacou, entre os 59 enunciados editados, o Enunciado 1, que, atualizado, garantiu a ampliação da proteção às vítimas ao orientar que, para incidência da Lei Maria da Penha, não importa o período de relacionamento entre vítima e agressor nem o tempo decorrido desde o seu rompimento, bastando comprovado que a violência decorreu da relação de afeto.

“Já o de número 45, conferiu força probatória à palavra da vítima, quando permitiu que as medidas protetivas pudessem ser deferidas de forma autônoma, apenas com base na palavra da vítima.”

Conheça os enunciados aprovados:

Depoimento especial para mulheres

Um dos novos enunciados aprovados é o número 57, que diz respeito à possibilidade de utilização do depoimento especial para assegurar a forma humanizada na coleta de depoimentos. Nesses casos, a escuta poderá contar com a ajuda de equipe multidisciplinar, atendendo os preceitos de respeito e humanidade ao que a vítima passou (ou ainda está passando).

A orientação está em conformidade com o artigo 10 da Lei Maria da Penha, com a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará) e a Recomendação (CEDAW), evitando retraumatizações.

Na avaliação de magistrados e magistradas que aprovaram a medida, a utilização do depoimento especial pode contribuir para a melhor coleta de informação, possibilitando o resgate de elementos comprobatórios e fatos mais precisos que, em depoimentos comuns, podem não ser observados.

Outra orientação aprovada (Enunciado 58) determinou a dispensa da perícia médica para que seja concluído o crime de violência psicológica em relação aos casos de violência. “Não é preciso ter desenvolvido depressão ou pânico. O simples relato de que esta mulher passa por medo, insônia ou não se relaciona mais com outros homens já comprova esse dano psicológico”,explicou a presidente do Fonavid.

Reprovabilidade

Também foi reforçada a importância de se punir o autor de violência quando este causar um dano a mulher em frente aos filhos (Enunciado 59), inclusive por colocá-los em condição de perigo. O agravamento da pena ocorrerá no momento da fixação das chamadas penas-base.

Outra orientação aprovada pelo Fórum diz respeito ao Protocolo de Prevenção e Medidas de Segurança criado pelo CNJ para proteger magistradas, servidores e demais trabalhadoras da Justiça em relação aos crimes de violência doméstica e de gênero.

Elaborada com aprovação do Fórum, a Carta de Teresina recomenda que CNJ e Tribunais implementem canais de denúncia e acolhimento como forma de aumentar a segurança dessas mulheres profissionais que possam estar vivenciando situação de risco em âmbito familiar.

O espaço também serviria como um ambiente que apoie as profissionais a lidarem com a pressão e os danos psicológicos do trabalho relacionado à violência contra a mulher.

É uma estratégia para sensibilizar os tribunais que criem políticas públicas para acolher servidores e magistradas que passam por essa situação. Lidamos com homens autores de violência e que muitas vezes se voltam contra nós, contra as servidoras”, explicou a juíza Ana Cristina.

(Agência CNJ; Foto: Gil Ferreira)

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