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“Os pobres são muitos, os de cima são poucos e não apenas se conhecem, mas se ajudam”, afirma painelista em evento do Sintrajufe/RS

“Os pobres são muitos, os de cima são poucos e não apenas se conhecem, mas se ajudam”, afirma painelista em evento do Sintrajufe/RS

Nessa quinta-feira, 6, o Sintrajufe/RS deu sequência à jornada de formação “A saúde dos trabalhadores e trabalhadoras ameaçada: trabalhar, sim, adoecer, não”. Esse foi o segundo painel de uma série de seis encontros que acontecem até 2 de junho.

O tema foi “Formação do Estado brasileiro: as raízes da subalternidade”, que teve como palestrante o professor de Ciências Políticas e Relações Internacionais da Ufrgs Henrique Carlos de Oliveira de Castro, que afirmou que “a elite brasileira é responsável por uma construção hegemônica de valores que faz com que o próprio povo odeie o povo".

A mediação foi da diretora do Sintrajufe/RS Mara Weber e do diretor Walter Oliveira. O evento foi transmitido pelos canais do sindicato e por entidades parceiras. Mais de 600 pessoas assistiram durante a transmissão, várias delas interagindo e enviando perguntas e opiniões sobre o assunto abordado.

Mara Weber iniciou o painel relembrando a importância de entendermos o histórico da violência nas relações de trabalho dentro das especificidades da sociedade brasileira. Segundo ela, precisamos entender qual é a nossa herança de um Estado no qual muitas coisas não estão bem resolvidas, não tiveram uma discussão social de superação, como a escravidão, o racismo, o machismo e o patriarcado, o estupro de indígenas e negras na cultura do Brasil. “Isso tem a ver com o tema dessa jornada tratado na semana passada, de assédio moral e sexual em ambiente de trabalho e a busca do enfrentamento de toda situação de violência e opressão a partir da compreensão de onde a gente está”, explicou.

Ao agradecer a presença do convidado e dos participantes que acompanhavam o evento online, o diretor Walter Oliveira afirmou que “temos que estudar e conhecer, saber de onde a gente veio e para onde queremos ir. Temos que começar a querer ir para algum lugar e querer uma sociedade mais justa, igualitária e democrática”.

Um projeto mundial de capitalismo

Henrique Castro começou sua fala explicando que o surgimento do Brasil não é fruto do atraso, mas fazia parte do plano mais avançado do capitalismo emergente de sua época.
Uma evidência disso foi o estabelecimento do tratado de Tordesilhas e das capitanias hereditárias, que determinaram desde cedo a função da nova colônia, sobre a qual teoricamente ainda não se tinha notícia. Para ele, o país já surgiu calcado num modelo que vinha de fora e que funcionava segundo os interesses de sua elite. “No Brasil, o Estado chegou antes do povo”, pontuou.

Justamente pela subserviência ao sistema pré-ordenado, Castro defende que a questão principal para a escravidão colonial foi o trabalho, a força de trabalho, não a cor da pele das pessoas escravizadas. “A história da escravidão é a história da humanidade”; antes de uma questão da cor, se trata de poder. E negros e negras foram identificados com o que era considerado a coisa mais sórdida, ou seja, o trabalho, o suor pelo trabalho.

Essa ojeriza ao trabalho se perpetua na classe dominante até hoje e foi transmitida como ideologia que formou uma classe operária, em grande medida, sem consciência de si e que também vê o trabalho como algo indesejado: “Nós reproduzimos essa aversão ao trabalho”.

Elite voltada para fora
O professor seguiu apontando que o Brasil formou uma elite que é totalmente voltada para o exterior, que quer estudar fora, antes de criar condições para estudo aqui – isso seria evidenciado pelo fato de que fomos o último país da América do Sul a fundar uma universidade. Outro indício é que no Brasil também não houve um libertador, como em outros países do continente, na ocasião de suas independências. No nosso caso, o processo foi realizado pela própria elite, por um membro da realeza da metrópole, como uma maneira de impedir a posse do território por outros colonizadores.

Essa mesma elite acredita que o principal modelo de democracia e liberdade é o ideal norte-americano, sem atentar para o fato de que a única liberdade defendida nesse modelo é a econômica. “O maior produto de exportação dos EUA não são seus commodities, nem o Facebook nem o Google, mas a “democracia”, como eles a entendem e querem que exista. Eles exportam capital e ideologia”, sinalizou o professor.

Para Henrique Castro, a raiz da nossa desigualdade está “numa elite vendida e antipovo, dedicada a fazer com que a população consuma seus valores”. No que, infelizmente, tem sido bem-sucedida. “Nós aceitamos que a melhor maneira de organizar nossa sociedade é a que nos foi imposta.” Esse contexto teria gerado um terreno fértil para o autoritarismo e o crescimento da direita.

Mara Weber acrescentou que isso ficou muito visível nos últimos tempos com as manifestações contrárias aos avanços sociais que pudemos presenciar com a chegada das classes mais baixas aos aeroportos e outros espaços considerados prestigiados socialmente. E concluiu: “O capital se desvencilhou do humano. Um dos processos de opressão mais intensos que já vimos dentro do capitalismo.”

Questionado sobre possíveis mudanças, Castro afirmou que o histórico brasileiro não o faz crer em mudanças por vias eleitorais. Mas que acredita que a união de pessoas interessadas em compreender nossos problemas possa ser útil para uma transformação das coisas – mesmo que não seja a academia a fonte das mudanças.

Sobre o painelista
Henrique Carlos de Oliveira Castro é doutor e mestre em Ciência Política e professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política e do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É professor convidado da Universidad Técnica Privada de Loja, Equador e pesquisador e professor convidado do Kellogg Institute for International Studies at the University of Notre Dame, EUA. Castro é pesquisador principal da Pesquisa Mundial de Valores (World Values Survey) e diretor nacional no Brasil e integra o Grupo de Trabalho Values 20 (V20), uma comunidade global de especialistas e profissionais acadêmicos que tem como objetivo propor políticas públicas nacionais e globais para os líderes do G20 baseadas em valores e centradas nas pessoas.

A jornada continua na próxima quinta, 13 de maio, também às 18h30min, com o painel “Quem é o poder Judiciário brasileiro – qual Judiciário queremos?”, que contará com a presença do advogado e professor de Direito Lênio Streck.

São fornecidos certificados de participação mediante preenchimento do formulário linkado no box de informações.

Todos os eventos da jornada são transmitidos pelo canal do YouTube do Sintrajufe/RS e Facebook do sindicato. Entidades parceiras também fazem a divulgação e/ou retransmissão de cada painel.

Entidades parceiras:

TRT4 e Escola Judicial do TRT4
Fenajufe (Judiciário Federal e MPU) e Fenajud (Judiciário Estadual)
CUT/RS, CUT Regional Centro RS (Santa Maria e região) e FSST
Sindicatos do Judiciário Federal/MPU: Sindjuf/PA-AP, Sintrajuf/PE, Sisejufe/RJ, Sintrajusc/SC e Sindiquinze/SP
Sindicatos do Judiciário Estadual: Sindjustiça/GO, Sindijus/PR e SinjuSC/SC
Sindicatos de outras categorias: Assufsm, Cpers/RS, Semapi/RS, Sindiágua/RS, Sindipetro/RS, Sindjor/RS, APP Sindicato (educação pública do Paraná)

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