ADI 2.238: Servidores citam ‘dignidade humana’ contra ameaça a salários em pauta no STF
Às vésperas do Carnaval, Supremo pode julgar ação referente à permissão para redução salarial de servidores públicos de municípios, estados e da União.
Sintrajud (SP)
Hélcio Duarte Filho
Carta assinada por nove entidades nacionais de servidores públicos cita o princípio da ‘dignidade humana’ para defender que o Supremo Tribunal Federal mantenha a impossibilidade de entes da federação reduzirem salários de seus servidores para se adequar aos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2.238) está na pauta da sessão plenária do STF marcada para quarta-feira (27). O tribunal vem sendo pressionado por governadores a derrubar a medida cautelar que suspendeu os dispositivos da lei que permitiam à administração pública reduzir salários e jornadas de servidores para encolher as folhas de pagamento. Documento conjunto com esse teor foi subscrito por secretários da Fazenda de sete estados: MG, RS, GO, PR, AL, MS e PA, além de ter sido apoiado publicamente pelo governo de São Paulo.
O relator da ação é o ministro Alexandre de Moraes, que, ao receber dirigentes sindicais do funcionalismo, negou a possibilidade de adiamento do julgamento. O ministro disse aos servidores que a matéria só não começaria a ser apreciada se o julgamento das ações referentes à criminalização da homofobia não fosse concluído.
‘Situação grave’
A carta alerta para a gravidade do que estará sendo decidido pelos onze ministros do Supremo. “A depender do julgamento pelo STF, a flexibilização da estabilidade do funcionalismo público estará permitida, assim como também estarão permitidos cortes lineares no orçamento, quando a arrecadação prevista pelos estados não se concretizar. A situação é extremamente grave”, diz trecho do documento.
O documento é assinado pela Fenajufe, Fasubra (servidores técnicos das universidades federais), Fenafisco, Fenafim (auditores municipais), Fenasepe (servidores estaduais), Fenajud (servidores das Justiças Estaduais), Fenaprf (polícia rodoviária federal), Fenaspen (servidores do sistema penitenciário) e Fenapef (policiais federais).
A “dignidade da pessoa humana” citada na carta dos servidores é um dos princípios fundamentais estabelecidos na Constituição Federal de 1988, em seu primeiro artigo – no qual se busca assegurar que cada cidadão tenha seus direitos respeitados pelo Estado e condições para que possa viver em condições dignas.
A ação
A decisão do Plenário do STF de suspender os dispositivos da LRF foi tomada liminarmente em maio de 2002, quando quem presidia o tribunal era o ministro Marco Aurélio de Mello. O artigo 23 da Lei de Responsabilidade Fiscal foi suspenso com base no princípio constitucional da irredutibilidade dos salários de servidores. À época, o relator do processo era o ministro Ilmar Galvão, que se aposentou no ano seguinte. A composição da Corte máxima do país que poderá julgar a ADI será bem diversa da daquele momento: dos onze ministros de então, apenas Celso de Mello e Marco Aurélio vão estar presentes. Ambos votaram, naquela sessão de maio de 2002, favoráveis aos servidores – numa decisão, aliás, unânime da Corte.
Ação sindical
Nos últimos dias as entidades sindicais nacionais também têm buscado dialogar diretamente com os ministros do Supremo, e no parlamento, sobre a gravidade da ação em debate. Na semana passada, as direções e assessorias jurídicas das federações estiveram reunidas com as lideranças dos partidos que ingressaram com a ADI à época em apoio aos servidores e obtiveram a liminar que até o momento impede a redução salarial e o ataque à estabilidade. Subscrevem a ADI o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB). São entidades amicus curiae a Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis) e a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), além da representação do Ministério Público em diversos estados.
“A ação é muito antiga e, à época, não foi admitido o ingresso de mais entidades representativas na condição de amicus curiae, mas estaremos lá acompanhando o julgamento. E o nome do Cezar Britto, advogado que assessora, entre outras entidades, a Fenajufe, é unânime para, caso o Supremo aceite que a sustentação oral possa ser feita também por ele, além dos advogados dos partidos que subscrevem a ação e da Condsef (uma das entidades que na época foi aceita como amicus curiae), fazer a defesa dos trabalhadores no plenário da Corte”, informa Adilson Rodrigues. Servidor da JF/Santos e coordenador geral da Fenajufe, Adilson está em Brasília para acompanhar o julgamento e tem participado das articulações junto aos ministros do STF e partidos.
O diretor do Sintrajud Fabiano dos Santos também estará em Brasília nesta quarta acompanhando a sessão de julgamento.
Confira abaixo a carta das entidades
“SERVIDOR PÚBLICO: NO DIA 27 DE FEVEREIRO O STF PODERÁ MUDAR A SUA VIDA”
“O Supremo Tribunal Federal poderá julgar no dia 27 de fevereiro de 2019 uma das ações com maior repercussão negativa para o serviço público, não considerando o princípio da dignidade da pessoa humana. É disso que trata a ADI 2.238, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, que discute, em síntese, a possibilidade de os estados em crise reduzirem salários e a carga horária de funcionários públicos, quando os gastos com as folhas de pagamentos superarem o limite máximo estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal. A depender do julgamento pelo STF, a flexibilização da estabilidade do funcionalismo público estará permitida, assim como também estarão permitidos cortes lineares no orçamento, quando a arrecadação prevista pelos estados não se concretizar. A situação é extremamente grave. O DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) apresentou dados obtidos junto ao SICONFI – Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro do Tesouro Nacional que revelam que, apenas no 2º quadrimestre de 2018, a maioria dos estados, relativamente às despesas de pessoal do Executivo, já estavam acima do limite prudencial da LRF (46,55% da receita corrente líquida) e dois estados acima do Máximo (49,00%). Se a ADI for negada ao servidor público, a partir do dia 28 de fevereiro, pelo menos 16 (dezesseis) estados já poderão efetuar 25% (vinte e cinco por cento) de cortes salariais, reduzindo a carga horária proporcionalmente. As entidades abaixo mencionadas manifestam a sua preocupação com o resultado da ADI 2.238 e buscarão, de forma conjunta e urgente, apoio de outras entidades sindicais, bem como dos sindicatos que coordenam, para lutarem em favor dos direitos dos servidores públicos, claramente ameaçados.”
Colaborou: Luciana Araujo