Por Sintrajud (SP)
Articulação entre as cúpulas dos 3 poderes assegura aprovação relâmpago, enquanto atual e próximo governo tentam pautar projetos contrários a trabalhadores
Menos de uma hora. Esse foi o tempo de discussão gasto por senadores no plenário para aprovar o controverso projeto que prevê reajuste de 16,38% para os ministros do Supremo Tribunal Federal, ocorrido no dia 7 de novembro. O presidente da Corte, Dias Toffoli, teria atuado pessoalmente para isso e utilizado o auxílio-moradia como moeda de troca para justificar o reajuste. Como, aliás, já fizera na reunião com o presidente Michel Temer, em outubro, que selou o acordo em torno da questão. Poucos dias mais tarde, veio a notícia da decisão do governo federal de editar medida provisória adiando a parcela de reajuste de diversas categorias do funcionalismo federal do Poder Executivo de 2019 para 2020 – referentes a reajustes concedidos ainda em 2016 ou 2017.
O empenho do presidente do Supremo Tribunal Federal pela aprovação da matéria contrasta com a vagarosa tramitação na corte máxima do país da ação, com repercussão geral, que trata da revisão salarial anual de cerca de 11 milhões de servidores públicos do país, em todas as esferas de governo e poderes. Toffoli segura o voto-vista ao processo desde que tomou posse, em 13 de setembro.
O reajuste aprovado no Senado elevará a remuneração dos ministros do STF de R$ 33,7 mil para R$ 39,3 mil. terá ainda efeito cascata entre magistrados, procuradores, ministros de Estado, governadores, parlamentares e presidente da República. A articulação na alta cúpula dos três poderes para viabilizar o aumento ocorre concomitante a uma movimentação pelo congelamento dos salários dos servidores e a aprovação de propostas que eliminam benefícios previdenciários. Até mesmo a redução dos salários da categoria, via aumento da alíquota de contribuição à Previdência, está sendo cogitada – a quem fale em percentual de até 22%, o dobro do atual.
Auxílio-moradia
A jornalistas, o ministro Dias Toffoli afirmou que agora o problema do auxílio-moradia poderá ser enfrentado. “Com a aprovação do novo subsídio, nós podemos então resolver essa questão do auxílio”, disse. O que chama a atenção é que o polêmico benefício está sob julgamento no STF e é mantido por meio de uma liminar concedida pelo ministro Luiz Fux em setembro de 2014, extensivo mesmo a juízes que possuam um ou mais imóveis próprios na cidade onde atuam.
A declaração do presidente do Supremo Tribunal Federal dá a entender publicamente que a colocação do processo em pauta dependeria antes de uma compensação financeira salarial para uma eventual decisão contrária ao benefício do que da agenda de processos da Corte.
Ao reconhecer isso, Toffoli alimenta a impressão, por outro lado, que a inexistência de uma decisão do STF referente à revisão salarial anual do conjunto do funcionalismo que faça valer a previsão constitucional é uma omissão ou opção política. A revisão anual dos salários dos servidores foi introduzida por emenda na Constituição Federal em 1998 e vem sendo desrespeitada sistematicamente pelas administrações públicas. O STF possui decisão favorável à categoria, de maio de 2001, mas que se tornou inócua pela inexistência de penalidades para o governante que não cumpri-la. A ação em curso no Supremo busca justamente impor uma multa pecuniária à administração pública quando ela desrespeitar essa determinação constitucional.
Sem negociações
O empenho e a agilidade da cúpula da suprema corte brasileira em prol da majoração de seus próprios vencimentos também contrasta com a má-vontade da administração do Tribunal em iniciar um processo de negociação com as representações sindicais dos servidores do Poder Judiciário Federal. A solicitação de restabelecimento de um canal permanente de negociação, feita reiteradas vezes ao longo dos dois anos da gestão de Cármen Lúcia e novamente à Presidência de Toffoli, segue sem resposta.
Não são poucas as questões que os servidores – representados pela Fenajufe e os sindicatos – querem levar ao STF neste momento crítico da conjuntura nacional. Em meio à ameaça de um futuro colapso nos tribunais por conta da asfixia orçamentária decorrente da Emenda Constitucional 95, do risco de congelamento salarial permanente para o funcionalismo, da possível redução brutal de direitos previdenciários e da movimentação de certos setores a favor da extinção da Justiça do Trabalho, resta saber o que pretendem os ministros da corte máxima do país: se vão estar mobilizados apenas para assegurar a controversa elevação de seus já generosos contracheques a quase R$ 40 mil ou se vão mover esforços para a abertura de um canal de diálogo no qual ouçam as demandas dos servidores e se posicionem sobre temas tão cruciais para a própria existência do Poder Judiciário no Brasil.