Audiência pública debate direito de greve no serviço público

Nesta quinta-feira (20/02), a Comissão Mista de Consolidação de Leis e de Dispositivos Constitucionais realizou audiência pública para discutir o anteprojeto de regulamentação do direito de greve dos servidores públicos. O presidente da comissão, deputado Cândido Vacarezza (PT/SP), e o relator, senador Romero Jucá (PMDB/RR), ouviram representantes de oito centrais sindicais na tentativa de costurar um acordo no texto.

Mas, segundo o coordenador da Fenajufe, Adilson Rodrigues, que esteve na audiência, a proposta deveria ser arquivada, principalmente neste momento em que os servidores públicos federais estão organizando campanha salarial e cobrando do governo a abertura de negociações para tratar da pauta de reivindicações protocolada em janeiro. “Está claro que o governo quer cercear o exercício do direito de greve dos servidores e restringir cada vez mais o direito de manifestação da sociedade em geral, pois não é à toa que sua base aliada no Congresso está trabalhando para aprovar também uma lei sobre terrorismo com o objetivo de criminalizar os movimentos sociais”.

Aberta a audiência pública, a primeira central sindical a se manifestar foi a CUT. De acordo com a representante da entidade, Maria das Graças Costa, é preciso haver, antes de tudo, regulamentação de negociação coletiva, para depois regulamentar o direito de greve. Para ela, é importante também assegurar a liberação de dirigentes sindicais.

Rubens Romão, da Força Sindical, afirmou que uma regulamentação só teria sentido para garantir o direito de greve, e não de cerceá-lo, como é o caso da proposta relatada pelo senador Jucá.

Luiz Carlos de Oliveira, da UGT, criticou a proposta em questão porque, além de não garantir o direito de greve, não contempla data-base nem dissídio coletivo. Ele criticou ainda o fato do Brasil ainda não dar cumprimento da convenção 151 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que estabelece o princípio da negociação coletiva para trabalhadores do setor público.

João Paulo Ribeiro, da CTB, disse que a proposta tira a autonomia dos sindicatos e ressalta que, antes de tudo é preciso respeitar os trabalhadores do serviço público, que também devem ter o direito à greve.

Lineu Neves Mazano, da NCST, além de não concordar com o texto da proposta de regulamentação do direito de greve relatada por  Jucá, criticou o excesso de cargos comissionados e a crescente terceirização que estão descaracterizando o serviço público.

Flávio Werneck Meneguelli, da CSB, se contrapôs à afirmação do deputado Vacarezza, que havia afirmado não ser possível incluir, na redação do anteprojeto da lei de greve, questões que não sejam exclusivamente relativos ao tema. “Nesse projeto é possível legalmente contemplar direito de greve, recomposição inflacionária e negociação coletiva, e é isto que deveria ser feito”.

Flauzino Antunes Neto, da CGTB, também não concorda com a proposta de Jucá por entender que se trata da tentativa de criminalização do direito de greve. Ele citou ainda sobre outros problemas que os servidores vêm passando, como perseguições por diversos motivos, além de assédios moral e sexual.

O último a falar foi Saulo Arcangeli, da CSP CONLUTAS, que começou afirmando que os servidores públicos estão em campanha salarial e cobrou uma posição do poder Legislativo sobre o cumprimento de um dos artigos da constituição de 88 que garante a data-base do servidor público, pois ano a ano é este direito vem sendo desrespeitado pelo executivo, que não tem uma política salarial permanente para o conjunto dos servidores. Reforçou que “o Congresso precisa, primeiramente, regulamentar a Convenção 151, pois foi aprovado na casa em 2010 e depois de três anos, a partir da pressão dos trabalhadores, a presidente Dilma promulgou, e que depende agora de um lei para regulamentá-la no Congresso”. A negociação coletiva é um mecanismo fundamental para evitar as práticas antissindicais na União, estados e municípios, garantir a independência das organizações sindicais frente os governos, a liberdade sindical plena para que os trabalhadores possam participar das atividades sindicais e um processo amplo de negociação das pautas dos trabalhadores.

Ainda segundo Saulo, o governo faz chantagem com os servidores, oferecendo a possibilidade de negociação coletiva e tentando cercear o direito de greve. Por este e outros motivos é que a CSP Conlutas não assinou o documento enviado pelas demais centrais ao governo, pois foi fruto das discussões da mesa de negociação com o Ministério do Planejamento que reforça esta posição. Para finalizar, Saulo disse que “o direito de greve deve ser autorregulamentado pelos trabalhadores, que tem responsabilidade e sabem quando e como fazer a greve, respeitando os serviços urgentes e essenciais, sendo que a proposta aqui em debate quer, na verdade, acabar com o direito de greve no serviço público e está inserido num contexto onde busca-se a criminalização dos movimentos sociais, unindo-se ao projeto sobre terrorismo para criminalizar os movimentos sociais que foi aprovado ano passado nesta comissão”.

Após as manifestações dos sindicalistas, Jucá afirmou que já houve avanços no debate com as centrais sindicais e que esta audiência não encerra as discussões. Segundo ele, “não haverá atropelo e só vai haver votação após aprofundarmos ainda mais o debate para a construção de uma nova proposta”. Ele disse que a Constituição estabelece no art. 37, inciso VII, que o direito de greve dos servidores públicos “será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”, mas que passados 25 anos, a regulamentação ainda não foi feita. Sobre o projeto antiterrorismo aprovado na comissão, disse que de forma alguma é para criminalizar as manifestações que ocorrem no Brasil.

Contudo, o fato é que o anteprojeto sobre direito de greve retira direitos por vários flancos, com destaque para a essencialidade de quase todos os serviços públicos, a definição do percentual de trabalhadores em greve, a possibilidade de corte de salários, a limitação à liberdade sindical ao criar critérios para que os sindicatos possam deliberar a greve, a judicialização do movimento permitindo que o Judiciário possa definir o fim da greve, entre outras. No caso específico do Poder Judiciário e do Ministério Público da União, o relator pretende considerá-los como serviço essencial, fazendo com que 60% dos servidores tenham que trabalhar durante a greve.

Por Eduardo Wendhausen Ramos

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