A Associação dos Magistrados do Estado de Pernambuco – AMEPE- recebeu com surpresa manifesto assinado por 34 juízes (as), em repúdio a curso promovido pela associação. Segundo os próprios magistrados o curso de temática antirracista, tem viés ideológico e que o racismo é “causa social”, não cabendo a Associação fazer a abordagem.
O documento divulgado no domingo – (22), contrapõe às manifestações contra o racismo que aconteceram em várias cidades no final de semana, depois que seguranças de uma rede de hipermercados espancaram um cliente negro até a morte, em Porto Alegre. As cenas que chocaram o Brasil por tamanha violência escancaram o racismo existente no país onde 56% da população é negra.
A discussão racial colocada como uma questão ideológica pelos juízes (as) num momento em que acompanhamos o crescimento da intolerância, violência e do racismo em nossa sociedade é no mínimo não reconhecer o papel social e humanitário que o Judiciário deve prestar. É o mesmo que jogar por terra as ações afirmativas tão necessárias que o PJU busca implementar nos seus órgãos no sentido de diminuir as desigualdades no sistema de justiça.
Em sua defesa, o grupo de juízes argumenta que a magistratura não deve apoiar correntes ideológicas para não criar subgrupos ou “cisões internas”. Os assinantes do documento se reconhecem como poderosos ao afirmarem que são o “ topo da carreira pública”, e que possuem uma missão diferenciada que é julgar.
O curso “O Racismo e suas Percepções na Pandemia”, proposto pela diretoria de Direitos Humanos da Amepe seria voltado exclusivamente para magistrados. O propósito contido na programação era trazer esclarecimentos, conscientização e reflexão no momento de assinar uma sentença sem encontrar diferença no tom da pele.
Uma cartilha com expressões racistas que ainda fazem parte do cotidiano da sociedade brasileira, e que seria apresentada no evento também foi repudiada pelo grupo. A ilustração “Racismo em Palavras” foi elaborada com base em material divulgado pelo Ministério Público de Brasília. O Manifesto pela Magistratura de Pernambuco foi assinado por 34 juízes.
Ao negaram participação no curso, com a argumentação tão equivocada e questionável, os juízes viram as costas e colocam venda nos olhos para o debate racial que é tão importante e urgente. Para diminuir a distância do PJU com o resto da sociedade, o Conselho Nacional de Justiça criou este ano um grupo de trabalho para discutir o racismo e criar estratégias de combate nas estruturas do Poder.
Ações afirmativas no PJU
Resolução 203/2015- Reserva 20% de vagas em concurso público no âmbito do PJU e
Magistratura.
2017 – I Encontro de Juízes e Juízes Negras (Enajun), encontro idealizado por várias associações de juízes discute o racismo e busca política de enfrentamento das desigualdades existentes na magistratura, acontece anualmente desde então.
Julho/2020- CNJ cria Grupo de Trabalho para as questões raciais no PJU
Resolução 336/2020 – Reserva 30% das vagas em programas de estágio para candidatos negros, negras, afrodescendentes e indígenas no PJU
Levantamento realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, divulgado no relatório do GT sobre questões raciais em setembro, aponta que a equidade racial na magistratura brasileira só será alcançada no ano de 2044. Negar a discussão racial no PJU ou em qualquer segmento social é ignorar o conceito humanitário e da dignidade humana.
Leia Manifesto (AQUI)
Joana Darc Melo, da Fenajufe